sexta-feira, 30 de maio de 2008

11) SKATE E DESILUSÃO

Com bela fotografia, "Paranoid Park" mergulha no vazio da adolescência


Eduardo Júlio

É surpreendente e estimulante saber que um filme do diretor norte-americano Gus Van Sant está sendo exibido em São Luís neste período de vacas magras nas telas da cidade. E melhor, de forma quase simultânea ao eixo Rio-São Paulo. Pois “Paranoid Park” está em cartaz no Cine Praia Grande (Centro de Criatividade Odylo Costa, filho – Praia Grande), nas sessões de 16h30, 18h30 e 20h30, somente até domingo. Quem gosta de um cinema autoral, não deve perder.
Gus Van Sant é mestre em retratar a juventude desajustada norte-americana, em diversos contextos sociais. Ele também é habilidoso em revelar ou destacar novas promessas do cinema, como aconteceu com Matt Damon, que protagonizou “Gênio Indomável”, sua obra mais comercial. Isso, sem falar do saudoso River Phoenix, de “Garotos de Programa”.




Neste novo trabalho, todo encenado por atores desconhecidos ou não-atores, ele conta a história do adolescente Alex (Gabe Nevins), um skatista de 16 anos, que um dia decide visitar na companhia do melhor amigo, o mítico, temido e soturno Paranoid Park, onde se reúnem os skatistas mais radicais ou marginalizados de sua cidade. Porém, um imprevisto causa a desistência do colega e Alex vai sozinho. No parque, é convidado por um desconhecido para cometer um pequeno delito. Mas a aventura juvenil, que teria o sabor de transgressão (ou seria transcendência?), termina de forma trágica, com a morte de um homem.





Vencedor do prêmio do 60º Aniversário no Festival de Cannes 2007 e baseado no livro de Blake Nelson, “Paranoid Park” narra o vazio da adolescência. A armadilha do destino é um pano de fundo para a falta de perspectiva de Alex. Ele é filho de pais separados ou desencontrados e não consegue abrigo e satisfação com ninguém, nem com a namorada. Perplexo e amedrontado com a situação em que se depara após o acidente no parque, o jovem passa por momentos de reflexão e isolamento.


Embora “Paranoid Park” mostre que muitas vezes somos reféns do imponderável e contenha uma cena de grande violência, é lírico, e chega a ser leve e suave como a tez dos jovens mostrados nas cenas. Aliás, a fotografia também é destaque. O diretor usa e abusa de closes, câmeras lentas, imagens em Super 8, por vezes desfocadas, numa analogia à confusão mental dessa fase da vida ou mesmo ao grande problema vivenciado pelo personagem. Há, ainda, muitas seqüências de manobras de skate, emolduradas por uma maravilhosa trilha de música folk e de rock. Inclusive, Gus Van Sant resgata a ótima canção “Angeles”, de Elliott Smith (morto em 2003), que já tinha estado presente em “Gênio Indomável”. E uma frase no longa é memorável: “Adultos só agem por dinheiro”.

RADICAL

Nos seus dois filmes anteriores, baseados em fatos reais, “Elefante” (2003) e “Últimos Dias” (2005), Gus Van Sant causou estranhamento ao optar por um radicalismo naturalista, com longos planos seqüências e poucos diálogos. O primeiro, abordou o massacre de alunos da escola Columbine, o outro retratou de forma fictícia a perturbação da etapa derradeira da vida de Kurt Cobain, talvez o último dos autênticos roqueiros.Mas nem sempre foi assim, a primeira fase de Gus Van Sant possui narrativa mais equilibrada, direta e até bem-humorada. Em “Drugstore Cowboy” (até hoje o seu longa “mais redondo”), estrelado por Matt Dillon e lançado em 1989, ele abordou de forma romântica o universo de um grupo de viciados em barbitúricos, que roubava remédios tarja preta nas farmácias. A película teve a acertada participação do escritor beatnik William Burroughs (1914 – 1997), o drogado mor, fazendo o papel de um padre ancião, numa cena antológica: “Deus lhe abençoe meu filho”, disse serenamente o clérigo, ao receber um pacote de barbitúricos.

Um comentário:

Polyana Amorim disse...

Eu adoro o trabalho do Gus Van Sant. Ele é um grande diretor, um dos melhores da atualidade, na minha opinião.
PAranoid Park é um filme e tanto por mexer com emoção, principalmente. O que se percebe é que a intenção não é mostrar efeitos externos ao acidente e sim, os internos. Como o ALex passou a viver depois daquilo. Ele aparentava estar bem, mas em determinados momentos, quando a cena ficava em 'slow' dava pra ter noção de como tava a cabeça dele, sem ter coragem de contar pra ninguém o ocorrido. É uma angustia compartilhada com quem assiste, Isso é creditado ao brilhante trabalho de câmera, edição e trilha. Perfeito!